Pode corresponder a uma forma de preguiça decidir não escrever o post que tinha começado há alguns dias, substituindo-o por palavras de outra pessoa que escreveu entretanto sobre o mesmíssimo assunto que eu procurava abordar (sem a clareza que pretendia, diga-se). Mas se elas retomam ideias que têm servido, mais que recorrentemente, a resistência perante a tirania do «politicamente correcto», fazem-no com uma limpidez que justifica completamente o traço grosso. Transcrevo assim um fragmento da crónica de Pedro Norton («O PC volta a atacar»), publicada hoje na revista Visão.
«Como muitas das grandes tragédia do século XX, esta variante do marxismo cultural que convencionou chamar-se «politicamente correcto» (PC) terá nascido pela melhor das razões: como intrumento de protecção dos mais fracos em cada sociedade. Mas desenganem-se os que pensam que o PC é apenas um conjunto de regras de linguagem mais ou menos ridículas destinadas a impedir discriminações injustas. O PC é muito mais do que isso. Tal como o próprio marxismo, o PC é um sistema ideológico fechado e autocontido que explica simplisticamente toda a história através das relações de poder entre versos grupos definidos com base na sua raça, género ou orientação sexual. De um lado encaixa os opressores: homens brancos, heterossexuais, ocidentais e demais demónios. Do outro cataloga vítimas: mulheres, negros, homossexuais, «não ocidentais», etc. Tudo o que primeiros façam ou digam é, não apenas errado mas intrinsecamente «mau» (no sentido moral do termo). Tudo o que os segundos entendam por bem fazer deve ser, por natureza, compreendido, defendido quando não aplaudido.
O fenómeno seria simplesmente idiota se o PC não fosse ele próprio profundamente «politicamente incorrecto». Ou, dito de outra forma, se o PC, nascido como forma de combater a intolerância, não se tivesse transformado numa das ideologias mais intolerantes da nossa era. E se por essa via não estivesse profundamente empenhado em combater um das conquistas fundamentais das sociedades liberais: a liberdade de expressão. O fenómeno seria simplesmente caricato se, em pleno século XXI, não estivéssemos a comprometer o debate livre e a afastar do campo das ideias que são admissíveis todas as que não passam pelo crivo prévio do PC.»