Dantes gostava de ciclismo. Às vezes com algum amigo, outras vezes sozinho, uma das minhas brincadeiras nas longuíssimas férias de verão consistia em fazer corridas com umas pequenas bicicletas de plástico colorido movidas a golpes de dados. As provas, que incluíam até um prémio de montanha, viviam principalmente dos duelos entre o sportinguista João Roque e o benfiquista Peixoto Alves (bem, já não sou da época do Trindade contra o Nicolau…). Quando Agostinho passou a ganhar tudo, desinteressei-me pelo circuito pátrio e internacionalizei a corrida, que incluía agora os duelos mortais e alpinos entre Jacques Anquetil e Raymond Poulidor, aos quais se juntaria depois o próprio Agostinho. Admirava em todos eles o esforço visivelmente brutal, feito de músculos e vontade, do homem absolutamente sozinho contra o calor do sol, as rajadas do vento e os grandes declives. Depois fui-me distanciando. Talvez isso tenha acontecido na altura em que o jogo de equipa se começou a sobrepor à capacidade individual. Já fora de tempo, Lance Armstrong terá sido, porventura, o último dos meus super-heróis do selim e do pedal. Hoje, sem grandes estrelas no pelotão e com a desconfiança instalada devido à sucessão de casos relacionados com o uso de estimulantes, deixei de me interessar por este desporto de estrada. O Tour de France – esse «exercício colectivo de nostalgia» – está a chegar aos Campos Elísios e eu mantenho a televisão desligada.