Gosto de festas e nada tenho, garanto, contra a Festa do Avante! Em democracia, todos os partidos têm o direito de realizar os acontecimentos que entendam e, para mais, «a Festa» do PCP é sempre bem organizada e muito mais decente que aquele forrobodó etílico preparado no Chão da Lagoa pelos idólatras de Alberto João Jardim. Aliás, já fui a algumas, das quais conservo até excelentes recordações. A organização «da Festa» implica muitas pessoas, mobilizadas com antecedência, que dão o seu melhor em prol da celebração anual que lhes transmite a sensação de pertencerem a um colectivo que tem do seu lado os ventos da História. Poucas delas parecem reparar no facto de uma grande parte dos presentes ali estar como se está numa feira, numa romaria ou num festival de rock, nada lhes importando que seja o PCP, a Comissão Fabriqueira ou a empresa Som da Frente a organizar o evento. O importante, para os militantes, é projectar uma imagem da grandeza do Partido e da perpetuidade dos seus ideais, e isso parece-lhes assegurado. «Um grande êxito» que congregou «o melhor do esforço e da iniciativa dos camaradas», dirá sempre algum relatório.
Aparte o comício final, ao qual vão apenas os indefectíveis, o tom «da Festa» é pois… mais ou menos o de festa. O programa é agora bastante mais fraco e repetitivo que o de outros tempos, quando os fundos eram generosos e estar presente no acontecimento representava até, para muitos grupos ou artistas, uma importante mais-valia promocional. Mas o que importa é «o espírito» e esse, naqueles dias, ganha um novo fôlego. No final, de pin ao peito e boné posto, os militantes cantam o hino do partido e regressam a casa com uma consciência de missão cumprida, enquanto os outros, os «amigos» e os infiltrados, há já longas horas que estão no seu domicílio com os pés metidos numa tina de água e a trincarem amendoins à frente do televisor.
Um acontecimento respeitável, e acima de tudo normal, não fora o estendal de kitsch e de pactos com o passado no qual foi transformado o Espaço Internacional, desta feita com «especial atenção aos 90 anos da Revolução de Outubro». A informação que consta do Avante! online – e que pode ler aqui – é eloquente a esse respeito. Um bom exemplo foi uma vez mais fornecido pelo paupérrimo e triste pavilhão da Coreia do Norte (ali mais singelamente designada como «Coreia»), o qual, apesar da míngua da oferta facultada aos visitantes, não deixou de evocar in loco o companheirismo dos comunistas portugueses para com os responsáveis pela monstruosidade concentracionária na qual se tornou o seu «Estado dos trabalhadores». Afinal, não terá sido um mero deslize, próprio da idade, aquilo que na semana passada declarou à Visão a «jovem esperança» da JCP Patrícia Machado: «Uma vez que a Coreia do Norte resiste ao imperialismo americano e busca o socialismo, continuará a contar com o nosso apoio». São «detalhes irrelevantes» desta natureza que estragam tudo, incluindo o «espírito festivo». Digo-vos eu, que sou um apóstata e um descrente.