Os ricos que paguem a crise

Capitalismo

O PCP pretende que a Assembleia da República produza um quadro legislativo capaz de permitir a «criminalização do enriquecimento ilícito». Já em tempos o tentou sem sucesso, mas considera agora, «tendo em conta que a evolução e a própria vida», que existem condições para que a proposta seja aprovada. Não estou em condições de comentar a substância jurídica desta iniciativa, mas de uma coisa estou certo: naquilo a que chamamos um estado de direito ninguém pode ser julgado duas vezes, e duas vezes condenado, pelo mesmo crime. Se o enriquecimento é ilícito, existiu antes dele um acto, ou existiram diversos actos, provavelmente conjugados, que determinaram essa ilicitude. Os quais deverão, sem qualquer dúvida, ser investigados, julgados e punidos de uma forma rápida, eficaz e exemplar. Am I wrong? É que de outra forma poderemos antecipar a culpa e retornar aos tempos – por certo saudosos para os presumíveis proponentes – da abjecção proudhoniana da propriedade, da punição dos kulaks pelo facto de o serem ou da criminalização discricionária dos «sinais exteriores de riqueza».

Adenda: No seu estilo próprio, sempre com algo de agreste que o distingue dos outros e lhe confere um sal que aprecio, Nuno Ramos de Almeida comenta este post apodando de «santa ignorância» a ausência de perspectiva que, na sua opinião, o terá determinado. Não vou contrariar o juízo, obviamente, até porque nem o Nuno sabe aquilo que eu sei nem eu domino tudo aquilo que ele conhece, mas de uma coisa pode estar certo: tenho os olhos suficientemente abertos, e experiência que baste, para distinguir a declaração de necessidade de legislação própria e ágil contra os crimes «de colarinho branco» – com a qual essencialmente concordo – da vontade indómita, presente em certos discursos, de mandar toda a gente com mais de cinco zeros no saldo bancário para as galés. É esta, pelos perigos que comporta, que me repugna. Quanto ao epíteto de «anti-comunismo» lançado sobre a intenção, talvez seja um bocadito exagerado: pelo menos tanto quanto o anátema de «anti-socialismo» lançado sobre quem apenas não aprecie José Sócrates e os seus queridos muchachos.

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