Organizado pelo Birkbeck Institute for the Humanities, da Universidade de Londres, decorreu em Março passado o colóquio On the idea of Communism. A identidade dos participantes anunciados – Alain Badiou, Slavoj Žižek, Michael Hardt, Toni Negri, Jacques Rancière, Gianno Vattimo, Terry Eagleton, entre outros – apontava para um encontro inédito entre superstars do pensamento contemporâneo interessadas no comunismo não tanto como núcleo programático mas como território da utopia e da experiência da mudança. E fazia também prever debates ardentes. A verdade, porém, é que os ecos foram chegando muito ténues e pouco existe na Internet sobre o acontecimento. Acaba no entanto de sair, no número de Julho-Agosto da revista Philosophie Magazine, uma reportagem crítica do evento, «Communista Social Club», da autoria de Jan Sowa, um jovem intelectual militante da esquerda radical polaca.
Sowa apoia-se particularmente nas intervenções de Badiou, Žižek, Rancière e Negri para afirmar que o conjunto não trouxe nada de novo em relação ao que se sabia já do pensamento de cada um dos autores presentes – o que não seria nada de inesperado, pois as fracturas não se produzem em intervenções de trinta minutos voltadas para um público militante de investigadores e estudantes –, estranhando igualmente o facto delas se apresentarem como monólogos, algo cerradas em raciocínios e apriorismos balizados, dos quais ninguém se parece ter esforçado muito por sair. O essencial da sua crítica centra-se porém em algo de muito concreto. Condicionado pela sua própria experiência de filho do «socialismo real», Sowa anota que «a maior insuficiência deste colóquio foi a ausência de uma análise aprofundada do comunismo enquanto regime que existiu realmente». Como se nada de verdadeiramente importante se tivesse passado, diz, entre a revolução de Outubro de 1917 e o triunfo do capitalismo neoliberal nos anos oitenta. Tem sido este, realmente, um dos limites da intervenção da esquerda anticapitalista não subsidiária do esclerosado modelo leninista-estalinista: um excessivo pragmatismo e uma dificuldade em repensar-se a partir de uma abordagem crítica do seu próprio lastro histórico, projectando novas possibilidades através de um processo psicanalítico de diálogo com as origens, as experiências e principalmente os erros.
Mas isto não significa que o colóquio de Londres se tenha transformado num pântano de vaidades académicas e de vontades dispersas a laborarem, cada uma delas, nas suas utopias pessoais. No final foram avançadas duas conclusões positivas que permaneceram transversais às intervenções de todos os participantes: «primo, o capitalismo não se encontra desprovido de uma alternativa, e secondo, o projecto comunista não é utópico no sentido negativo do termo, isto é, impossível». Porém, e contrariamente à leitura corrente de Marx, a sua afirmação não resulta de uma inevitabilidade histórica, mas sim de uma escolha que as sociedades podem e devem fazer em toda a liberdade. Será este o princípio, fundamental para uma conciliação da vida democrática com a afirmação cíclica de políticas de ruptura, sobre o qual a esquerda deverá continuar o seu trabalho. Combinando uma arqueologia descomplexada com a intervenção diária no processo de edificação de um mundo possivelmente melhor e mais solidário.