De repente lembro-me dos outros. Daqueles que permaneceram na penumbra, verdadeiramente na penumbra, ao longo da campanha. Olhados como eleitores potenciais, a quem seduzir, mas quase sempre ignorados na materialidade das suas vidas, nas diferenças que consubstanciam, nas expectativas e anseios que são só seus. Nas mulheres destacadas por preencherem quotas, aparentando paridade onde existe desigualdade de facto. Nos jovens transformados em figurantes, protagonistas para fazerem ruído e simularem futuro. Nos desempregados que perdem voz à medida que se distanciam da vida activa e se deprimem, fora de comícios, manifestações e arruadas. Nos imigrantes diligentemente varridos para longe das câmaras embora participem do nosso destino comum. Nos idosos cujos rostos passam num instante quando a televisão persegue os candidatos. Nos gays, nas lésbicas, nos artistas, nos intelectuais, arregimentados para evocarem um «capital de modernidade» perante a opinião pública, mas excluídos ou confinados a recantos invisíveis nas propostas concebidas para serem lidas pelo cidadão comum e decifradas pelos legisladores. Lembro-me de todos estes, que são milhões, e pergunto-me sobre o que lhes oferece a política institucional, aquela que verdadeiramente decide e governa as nossas vidas. Aquela cujos actores, após a dança das cadeiras, reocupará hoje os seus lugares reservados.