Terceiro texto da série sobre o presente e o futuro do Bloco de Esquerda. Depois do anterior, um tanto ácido no diagnóstico da situação, segue-se uma curta reflexão sobre a necessidade do debate. No quarto post identificar-se-ão alguns dos dilemas por onde este poderá passar.
Estando do lado de fora, só me chegam alguns ecos. Por isso não sei se a observação interna dos problemas com os quais se defronta agora o Bloco tem sido feita da melhor maneira. Mas existem sinais evidentes de crispação, traduzidos na rejeição liminar, por vezes pública, da posição de militantes e de simpatizantes que não se limitam a observar a espuma, a apontar pequenos erros de natureza táctica, pretendendo que se vá mais ao fundo dos problemas e que se debatam as escolhas centrais que parecem bloquear o partido. Não que estes sectores tenham necessariamente razão, ou razão em tudo, ou razão até ao fim, mas nem é isto que de momento está em causa. Preocupante, sim, é observar alguma resistência a um debate radical, isto é, que vá à raiz dos problemas e das escolhas, obviamente necessário e que nesta altura do calendário político se pode fazer sem riscos inultrapassáveis. Contrapondo-se uma reflexão que aparenta ser epidérmica, destinada a retocar a maquilhagem sem mexer nas rugas.
A verdade é que na esquerda, e na esquerda do Bloco também, parece permanecer ainda em algumas consciências um atávico «síndroma da linha justa», que insiste na dificuldade em questionar de cima a baixo as escolhas políticas fundamentais, aceitando que elas resultaram de logros ou de erros. Apesar dos múltiplos e dramáticos exemplos históricos dos desastres causados à mesma esquerda pela confusão entre certeza e convicção, continua a ocorrer, por vezes, uma dificuldade em rever posições, confundindo questionamento com maledicência ou traição, que deve bastante à escola de dogmatismo imposta pela matriz orgânica e moral leninista. Mesmo quando esta é formalmente renegada. Ao mesmo tempo, porém, são muitos os militantes insatisfeitos ou descontentes, e principalmente os simpatizantes e eleitores desconfiados, que conservam a esperança de – a partir de um debate aberto e sem complexos, pontualmente alargado até a não-militantes – ser possível diagnosticar os males, se necessário reformulando e reorganizando caminhos, e abrindo um futuro de esperança e de confiança para a imprescindível intervenção do Bloco nos tempos bem críticos em que vivemos. Mesmo que tal exija um ou outro safanão em algumas consciências e hábitos. [continua]