O PCP entre Abril e Novembro

PCP

Simplificando propositadamente, pode dizer-se que o biénio revolucionário português de 1974-1975 representou um Fevereiro de 1917 sem o subsequente Outubro. A tese central deste livro de Raquel Varela – na origem a sua dissertação de doutoramento – sublinha que, se este esteve perto de chegar, tal não aconteceu, ao contrário do que é frequentemente propagado, em larga medida devido às escolhas e aos métodos adoptados na altura pelo Partido Comunista Português. Deixa ainda claro que o fim daquele período de rápida mudança e de grandes expectativas, e a subsequente passagem a um regime democrático-liberal, foram pacíficos e ocorreram com escassa resistência devido à posição e às acções do mesmo partido. Em consonância com esta ideia, procura mostrar, uma vez mais ao contrário das interpretações dominantes, que bem ao invés das intenções revolucionárias e golpistas que lhes têm sido atribuídas nos momentos decisivos os comunistas escolheram governar com o Partido Socialista, procurando contornar as clivagens e as circunstâncias que pudessem pôr em causa essa linha estratégica.

A História do PCP na Revolução dos Cravos inscreve-se no campo de investigação próprio da história do presente, o qual oferece inúmeras possibilidades de pesquisa mas escapa aos domínios relativamente assépticos e mais facilmente consensualizáveis no qual trabalham os historiadores que se dedicam a épocas mais recuadas. Relaciona-se com interesses e preocupações ainda próximos, cuja energia se não diluiu, e incorre por isso em análises inevitavelmente controversas, sujeitas a confrontações, o que acontece neste caso. A abordagem documental da política do PCP face ao desenvolvimento do processo revolucionário e às posições dos socialistas e do MFA é exaustiva e permite contornar muitas das eventuais objecções, mas os limites colocados à investigação das fontes, em particular os erguidos pelo próprio PCP, não sendo da responsabilidade da historiadora deixam sempre em aberto a possibilidade do enredo escolhido vir a precisar de alguma afinação. Poderá, por exemplo, revelar-se útil uma inquirição das iniciativas e das pulsões revolucionárias experimentadas pelos sectores do partido mais directamente envolvidos nos movimentos de massas. Não é este no entanto o ângulo de análise deste trabalho, assumidamente centrado na intervenção do núcleo dirigente reunido em volta de Álvaro Cunhal. Neste sentido, nenhum estudo futuro poderá contornar a investigação exaustiva que lhe serviu de fundamento e o valor da dose de informação que oferece.

Raquel Varela, A História do PCP na Revolução dos Cravos. Bertrand Editora. 400 págs. Publicado na LER de Junho de 2011.

    História, Memória.