Se não trabalhar no ramo ou tiver alguém na família que o faça, ninguém no seu perfeito juízo defenderá a fast-food. Os hambúrgueres feitos de sabe-lá-deus-o-quê, os pedaços de frango subnutrido, as batatas fritas em óleo reciclado, os condimentos químicos untuosos e coloridos, o sal sempre em demasia, as bebidas ultra-açucaradas. Tudo, já se sabe, veneno para as pessoas normais e para as outras também. Claro que a slow-food da rua ao lado, se descontarmos alguns exageros puristas com os condimentos, é muito melhor. Mas a primeira é razoavelmente barata e adaptada ao ritmo da nossa vida intensa, enquanto a segunda requer mais tempo e quase sempre mais dinheiro. Sei através dos suplementos de fim de semana, das sugestões da nutricionista e das ameaças do médico que devemos evitar a rápida. E tento sempre fazê-lo. Mas para muitas pessoas com a carteira vazia e sem lugar ou tempo para cozinharem não existe alternativa, e é com ela que de vez em quando a dieta alimentar se equilibra um pouco.
Quando fui bolseiro durante uns meses de inverno na Paris do início dos anos noventa, recordo-me bem, só a McDonald’s, a Burger King ou a KFC me salvaram da miséria alimentar. O mesmo aconteceu em algumas viagens fora de portas, como sempre com o orçamento no limite. Não seria dos mais desgraçados – como Orwell, que na miséria de Londres ainda tinha, sabia que tinha, a alternativa de recorrer aos amigos ou à família – mas todos os dias comia ao lado de centenas de pessoas visivelmente pobres que ali iam para se aquecerem e contornarem a fome com algumas proteínas e os hidratos de carbono que o corpo pedia. Taxar fortemente a comida rápida, como acaba de sugerir o bastonário da Ordem dos Médicos, é proposta cega e precipitada que retiraria outra talhada à parca dieta alimentar de muitos, cada vez mais, dos cidadãos que menos têm e mais precisam. Logo agora que a fast-soup está a ter mais saída.