O publicista e escritor irlandês Richard Steele escrevia em 1710, na revista satírica The Tatler, que tinha ido visitar um amigo chegado do campo para viver em Londres. Mas este encontrava-se já deitado quando, às 8 da tarde, Steele se apresentara em sua casa. Voltou na manhã seguinte, pelas 11 horas, para lhe dizerem que o amigo ia começar a jantar: «Rapidamente descobri que o meu amigo seguia religiosamente os seus antepassados e respeitava os horários usados na sua família desde a época da conquista normanda.» Dei algumas vezes exemplos análogos enquanto falava a turmas de alunos sonolentos sobre o imaginário aldeão dos tempos que antecederam a abertura das estradas e a chegada da eletricidade. Ali, como todos trabalhavam desde a alvorada, e o trabalho doía, todos se deitavam «com as galinhas», ficando os ruídos e as sombras da noite a cargo dos espetros e das bruxas, dos quais aliás ninguém duvidava. Mesmo nas nas cidades, as coisas não se passaram de forma substancialmente diferente até ao surgimento das festas aristocráticas e à abertura dos cafés por volta do século XVII, começando então a noite a ter uma animação inteiramente nova. Com o aparecimento da iluminação urbana e a multiplicação dos teatros o processo foi completado, alterando-se profundamente o uso social e as representações simbólicas da vida noturna. A noite fugaz mas persistente «das paixões recusadas, das paixões descabidas», gravadas a canivete nas mesas dos bares, Lins dixit, chegou bastante tarde mas para ficar.