Não gosto de esconder a cara ou de trocar de nome para não ser reconhecido. Quando esta atitude se torna um hábito, associo-a sempre ao medo, ou então à perfídia, a formas ínvias de pensar ou de falar sem assumir a responsabilidade do que se pensa ou se diz. Já usei um nom de guerre, conspirativo, e com ele procurava camuflar a minha identidade. Aconteceu antes da democracia, quando fiz parte de uma organização política clandestina que combatia o fascismo e o colonialismo. Servi-me depois, episodicamente, de um pseudónimo literário, com o qual publiquei alguma poesia e dois ou três contos. Fiz ainda pequenas investidas em blogues, servindo-me ali de nomes inventados, mas mais como ensaios de heteronímia que como processos para dizer escondido o que supostamente, seria incapaz de pronunciar às claras. E usei ainda um ou outro nickname na Internet, sempre associado nos registos ao apelido e ao sobrenome inscritos no Cartão de Cidadão. Repugna-me o anonimato sem um motivo sólido que o justifique, as máscaras ou os óculos que escondem a expressão, as vozes que se alteram para camuflar o seu proprietário, os anoraques que tapam o rosto, o cabelo e os olhos, dando a quem deles se serve uma sensação de impunidade. A coragem é ainda uma atitude socialmente apreciada, e isso deveriam saber os adeptos ou companheiros de viagem dos grupos que, sob um regime injusto, mas que não segue os métodos das ditaduras, apenas se manifestam na sombra, ou escrevem sem dar o nome, sem assumir as razões e as consequências das suas escolhas. Ao dar o nome e a cara, darão um rosto mais humano e um sentido ético mais acentuado à sua luta, às suas razões, e ficarão mais próximos daqueles em cujo nome tomam a palavra. Elevando a sua causa perante o cidadão comum e elevando-se a si próprios também.