Ainda ontem aqui deixei um texto crítico mas esperançoso sobre as contradições do PCP e a necessidade destas serem superadas num processo dinâmico de aproximação política à esquerda, bem como num quadro de solução governativa do qual os comunistas poderão, e com toda a certeza deverão, fazer parte. Mas entretanto, durante os trabalhos do XIX Congresso, parece ter ficado muito claro o sentido tomado pela estranha «solução» de governabilidade que o partido advoga para Portugal. Um «governo patriótico de esquerda» (eis o novo mantra a partir de agora), do qual se excluem formalmente o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda (quem o comporá então? e como se chegará a ele?), que preparará uma viragem do país para o interior de si próprio (uma «cubanização» fora do tempo?), de costas para o projeto europeu (que em vez de ser reformado será abandonado), associada a uma «saída do euro» apontada como inevitável e salvífica.
A resolução política que consagra estes princípios parece, pois, mais a expressão de um extemporâneo wishful thinking, voltado para dentro do partido e para a sua solidificação, do que uma plataforma para construir um horizonte de esperança coletivo e partilhado. Pelo que se pode ver, o PCP tem pois ainda um caminho a percorrer até compreender que um programa de unidade à esquerda, credível e com capacidade de mobilização social, integra obrigatoriamente a produção de consensos e uma aproximação em princípios urgentes e fundamentais, não implica a aplicação do modelo de sociedade que supostamente advoga e que, no fundo, ninguém sabe ainda muito bem qual é. E até perceber que o caminho do desenvolvimento não passa pelo empobrecimento geral do país, ao qual, inevitavelmente, corresponderia a sua transformação numa jangada de pedra à deriva, empurrada pelos ventos talvez para o Mar das Caraíbas. Um cenário que pode sustentar a fé e as expetativas utópicas de muitos militantes, mas que não nos ajuda a resolver nada. Logo agora, que tanto precisamos.
Adenda importante, escrita ainda em 2/12 – O discurso final do secretário-geral incorpora algumas nuances de assinalar quer na dinâmica de recusa de uma unidade com outros partidos à esquerda, quer em relação à recusa absoluta do euro. Se esta for a posição oficial do PCP, ainda bem que assim é. É um sinal de abertura e de realismo. Mas os documentos propostos e aprovados, e muitas intervenções feitas perto ou longe dos microfones, parecem apontar ainda na direção que este post refere como dominante. Aguardemos que tudo se esclareça numa prática política diária mais aberta a consensos e menos colada a dogmas. Será bom para todos.