Pergunto-me, tal como se perguntará uma larga franja de portugueses interessados na queda do atual governo e na construção de uma solução de governabilidade à esquerda, se o PCP e o Bloco se darão conta da extrema gravidade que comporta o gesto de recusarem (o PCP abertamente, o Bloco implicitamente, dada a visível falta de empenho) a proposta do Partido Socialista e de António José Seguro para discutir eventuais alianças nas eleições autárquicas. É verdade que um dos flancos politicamente mais discutíveis, pessoalmente mais duvidosos e administrativamente mais obscuros do PS se define ao nível de boa parte das suas escolhas autárquicas. Vivendo e sendo desde há muito eleitor na cidade de Coimbra, estou particularmente habilitado para confirmar esta triste realidade. E sei perfeitamente que existe, aqui como em todo o país, um longo caminho a percorrer para que a aproximação à esquerda ocorra e sem desenvolva de um modo dinâmico e transparente, no respeito mútuo e no interesse da maioria dos cidadãos. Boa parte desse caminho será, aliás, forçosamente da responsabilidade do próprio PS. Mas não dar sequer ensejo a conversas sobre hipotéticas alianças a nível local, reagindo «de pedra na mão», constitui não só um ato de hostilidade em relação à possibilidade de construir alianças voltadas para a política do país como uma forma de mostrar publicamente que o sectarismo está longe de ser ultrapassado. Aceitando aproximações apenas se forem as «nossas regras» a determiná-las ou colocando sempre o acento tónico nas diferenças e nas divergências, apesar do tempo que vivemos, no qual uma rápida mudança de políticas associada a um vasto consenso eleitoral é, obviamente, a única solução para evitar o estado de calamidade e o salto do país para o mais negro dos abismos. O sinal que está a ser dado é negativo e deixará sequelas. E é também um fator de redução dessa dimensão de esperança sempre decisiva em tempo de mudança.