Nas últimas linhas de um dos derradeiros textos que ditou para a New York Review of Books, quando as palavras ainda lhe corriam fluídas pelo cérebro enquanto sentia já dificuldade em pronunciá-las com a clareza que sempre procurou, Tony Judt reflectia sobre os problemas da comunicação contemporânea: «Se as palavras se deterioram, o que poderá substituí-las? Elas são tudo aquilo que nos resta.» Não se referia, porém, ao seu problema pessoal, ao fim à vista da sua capacidade para comunicar, que sabia irrevogável: no artigo «Words» falava principalmente da preocupação com o recuo do antigo modelo de educação humanista, que tanto tem vindo a ser desacreditado pelos arrogantes campeões do «saber técnico». Falava da perda de voz dos que usam a língua, central nesse modelo que formou o seu e o nosso mundo, para conhecer sem coacções, para ocupar os espaços públicos do debate, para transformar a controvérsia num factor de dignidade e de liberdade. Falava da perda do lugar central da «fala pela fala», como processo de aproximação e de verdadeiro conhecimento. Dessa perda que, neste tempo que promove o triunfo do prático, do lógico, do eficaz, do «útil», muitos de nós sentimos, todos os dias, com dor e com preocupação. Dessa perda que Tony Judt observava mesmo em lugares, como as universidades, originalmente concebidas justamente para impedi-la de ocorrer: «A “profissionalização” do discurso académico – e a deliberada apreensão por parte dos humanistas da segurança da “teoria” e da “metodologia” – favorece o obscurantismo.» Judt via nas palavras, no uso e no abuso das palavras, na sua troca sem compromissos, o espaço ideal de resistência perante a incompreensão e o individualismo impostos pela falta de vozes críticas ou pelo ruído daquelas que tanto falam e nada dizem.