Viver numa cidade de tamanho médio como o é Coimbra, que possui além disso marcas históricas, sociológicas e culturais muito próprias, leva-nos ao confronto com uma gestão autárquica que tem, frequentes vezes, demasiadas vezes, caminhado a contracorrente daquilo que essas marcas reclamam. O que impõe o anseio e a necessidade de uma mudança rápida e substancial.
Coimbra é, no plano histórico, uma cidade antiga, central na fundação da nacionalidade e um motor na ligação do norte com o sul, crucial também na construção e na reprodução das elites dirigentes do país, fulcral ainda em momentos-chave da vida nacional, território matricial na identificação do padrão da língua e placa giratória de encontro de gerações e de pessoas vindas de todas as partes. No domínio sociológico tem mantido, independentemente dos ciclos do crescimento demográfico, um núcleo urbano largamente preenchido por elites letradas, profissionais liberais e, no geral, pessoas da classe média, para além de um volume único de estudantes universitários, ainda que muitos deles a demandem de forma sazonal; mas também uma população trabalhadora periférica e muitas vezes esquecida. No território da cultura, foi sempre um lugar de conhecimento e de contrastes, no qual o papel da Universidade, a defesa de algumas tradições locais e a abertura à mudança do mundo quase sempre conviveram, tornando a diversidade central na construção de uma identidade coimbrã que tem tanto de local e de nacional como de cosmopolita. Coimbra tem sido, por isso, um lugar de passado e de futuro: aqui se formaram muitos dos obreiros da ditadura, e daquele país voltado para dentro que o 25 de Abril deixou para trás, mas também muitos dos protagonistas do combate pela democracia e da abertura a novas realidades em permanente e rápida mutação.
No entanto, em grande parte dos quase quarenta anos de democracia que Portugal leva já, a governação da autarquia local, fazendo invariavelmente rodar na presidência da Câmara o Partido Socialista e o Partido Social-Democrata, pouco tem honrado essa identidade e aquilo que faz de Coimbra uma cidade diferente das outras. Divorciada muitas vezes da Universidade, seu núcleo central, e da população da periferia, mais olhada como massa de votantes que como protagonista, esta tem sido uma cidade governada sem um aproveitamento real das potencialidades humanas e da dinâmica massa crítica que comporta. Uma governação errática, sem uma planificação urbana coerente, sem transparência em termos de gestão da coisa pública, perdida nos meandros insalubres da lógica partidária, sem um esforço de coesão dos diversos segmentos sociais, sem um aproveitamento do potencial oferecido pela juventude ou pelo grande número de habitantes com elevada escolaridade. Também sem uma política cultural de rasgo que abandone o estreito regionalismo e projete a cidade, em colaboração com a sua Universidade, numa dimensão nacional e internacional capaz de captar a atenção e o interesse, como já aconteceu no passado, de potenciais visitantes que não cheguem aqui apenas para ver a Biblioteca Joanina, a Queima das Fitas ou o Portugal dos Pequenitos.
A democracia local tem porém, nas eleições autárquicas a decorrer, a possibilidade de se empenhar numa nova via. Um conjunto de cidadãos e de cidadãs, com e sem partido, unidos pela vontade de pôr cobro ao estado de inércia e apatia, apresenta-se nestas eleições autárquicas nas listas dos Cidadãos Por Coimbra, oferecendo uma candidatura à esquerda empenhada em combater a estéril alternância rotativista. Os tópicos centrais do manifesto público que apresentaram aos eleitores – uma política assente na participação, na transparência e na consciência social; uma aposta no valor de Coimbra no contexto do país e da Europa; uma qualificação urbana capaz de opor-se ao urbanismo desenfreado; o apoio a uma economia desenvolvida para a cidade e as pessoas; uma cidade culta e inteligente, que seja também sustentável e de bem-estar, além de valorizadora da tolerância, da memória e da cidadania aberta – chegariam para me convencer a apoiar os CPC. Mas conhecendo as pessoas que dão corpo ao projeto, o seu amor pela cidade e a vontade que têm de o fazer sem expectativas de promoção pessoal, leva-me a assumi-lo com a certeza de estar a fazer aquilo que, como cidadão participativo, homem de esquerda e amante desta cidade, entendo que deve ser feito.