A veloz ascensão do Podemos, «o partido de Pablo Iglésias», em Espanha, está a ser entusiasticamente acolhida por alguns setores da esquerda portuguesa. Nascido em parte dos movimentos populares, muitos deles de conceção espontânea, de indignação de rua contra a corrupção e as políticas de austeridade impostas pelo Partido Popular, faz todo o sentido que essa simpatia, por vezes sob a forma de fascínio, desponte entre quem por cá trava idêntico combate. Porém, sem se ter uma perceção detalhada dos contornos e das propostas do partido constituído há apenas oito meses, será de evitar assumir desde já uma posição, de apoio ou então de rejeição, que possa ser parcial ou injusta. Diante dos resultados de uma sondagem hoje divulgada pelo El País, na qual, se as eleições fossem agora, o Podemos teria 27,7% dos votos, ficando-se o PSOE pelos 26,2, o PP pelos 20,7, a Izquierda Unida pelos 3,8 e a UPyD pelos 3,4, é de manter uma posição atenta mas cuidadosa.
Se, por um lado, será de reconhecer o lugar do novo partido como instrumento de protesto, de denúncia e de busca de uma alternativa à política de destruição de direitos que tem vindo a ser imposta principalmente pelo governo de Mariano Rajoy, se será de compreender o impacto da sua imagem pública jovem, divertida, insolente e moderna – repare-se na sedutora conceção gráfica da sua propaganda, no estilo «vocalista de banda» de alguns dos seus mais conhecidos dirigentes –, por outro ele denota uma ausência de programa de governação ou sequer de propostas de gestão sustentada da coisa pública que parece apelar ao experimentalismo como princípio de poder. Além disso, tem vindo a disseminar uma atitude assumidamente antipartidária, com contornos por vezes populistas, de apelo a uma «democracia direta» que substitua aquela, imperfeita ou caduca, que está em vigor desde o período de transição. Uma atitude que tem tanto de simpático e de compreensível quanto, se não for apresentada de uma forma objetiva, de questionável e de perigoso. Principalmente em termos de equilíbrio político em tempo de crise social e de luta pela sobrevivência do regime que substituiu a ditadura franquista.
Por isso, pode, para já, seguir-se o Podemos com atenção, mas sem embandeirar em arco, simulando ver no horizonte aquilo que ainda ninguém percebeu muito bem se realmente existe e para onde vai. Há tanto óleo no asfalto aqui pela Europa que é preciso mexer nos fósforos com cuidado. Embora, convenhamos, em alguns momentos estes possam dar jeito.
[nota posterior: li o programa do Podemos, cheio de bons princípios mas escasssas propostas para quem se propõe governar, o que me habilita a não falar apenas de ouvido ou movido por qualquer preconceito, positivo ou negativo]