Vale a pena ler Estaline e os Cientistas. Uma história de triunfo e tragédia (1905-1953), de Simon Ings (ed. Temas & Debates – Círculo de Leitores, 2017; com alguns detalhes de tradução discutíveis). Trata-se de um livro extremamente útil para se começar a entender de uma forma mais completa, não marcada pela parcialidade, a história da Revolução de 1917 e da sua posteridade. A grande e mais impressionante lição que se retira desta leitura advém da demonstração de como o grande impulso dado pelo novo regime revolucionário à pesquisa em diversas áreas da ciência – em particular nos campos da mecânica e da biologia – deu lugar, a partir dos inícios da década de 1930, e sob a influência do conceito de «ciência proletária», bem como da qualificação da genética como «ciência burguesa», a uma inflexão total.
Materializada no afastamento, na detenção e mesmo na execução, em muitos casos sem julgamento, de milhares de cientistas, com consequências extremamente dramáticas para a vida das populações, sobretudo devido às opções científicas associadas a sucessivos desaires no domínio da produção agrícola. A fraude gigantesca produzida por Trofim Lysenko, suposto cientista e presidente da Academia de Ciências Agrícola entre 1940 e 1954, e que foi diretamente apadrinhada por Estaline, é apenas o mais conhecido dos episódios referidos, mas este livro relata bem a complexidade e a dimensão de todo o processo. Descrevendo de que modo um universo dinâmico, apoiado no estímulo dado à investigação científica, pôde ceder o lugar a um pesadelo fundamentado em pressupostos de natureza estritamente ideológica.
Nota: Com este post inicia-se aqui a divulgação de um conjunto de referências bibliográficas – estudos, ensaios e fontes documentais – sobre os projetos, as vias, as conquistas e as misérias da grande experiência histórica iniciada com a Revolução Russa de 1917. Procurando sempre separar de forma crítica o conhecimento histórico do mito e a reflexão do proselitismo. Ou o trigo do joio.