A frase é conhecida e recorrentemente citada, se bem que a sua origem literária seja, tanto quanto sei, desconhecida: «Por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher». Ela possui em regra uma óbvia e forte tonalidade machista, subentendendo que certos homens estão vocacionados para grandes obras, ou para grandes causas, e para terem tempo de se dedicar a elas deverão ter, na retaguarda, mulheres que arrumem a casa, vão às compras, eduquem os filhos, paguem as contas da água e da luz e lhes confiram a paz de espírito necessária para poderem dedicar-se por inteiro à nobre missão da qual se crêem investidos. Grandes mulheres, para muitas das mentes que produzem aquele juízo, serão estas, e não tanto as que concorrem com os homens por igual ou que não asseguram aos seus a devida supremacia na vida privada e em sociedade. Esta relação desigual é, obviamente, antiga, pois Plutarco, sem tomar como objecto da suas perto de cinquenta biografias uma só mulher, colocou-as sempre como fatores benfazejos ou influentes, imprescindíveis para acalmar a destemperada valentia que julgava caracteristicamente masculina.
Na noite de ontem passei por uma versão desta relação ao ver o filme The Wife (A Esposa), de Björn Runge, que valeu a Glenn Cose uma nomeação para o Óscar de melhor atriz principal de 2019. O argumento resume-se de forma rápida: é história de Joan (Glenn Close), que abre mão da vontade de se tornar uma grande escritora, e da capacidade que tinha para o vir a ser, para se dedicar integralmente ao seu professor e em breve seu marido Joe Castleman (Jonathan Pryce). Quando este ganha o Prémio Nobel de Literatura e o casal viaja até Estocolmo para o receber, a tensão começa a ganhar corpo no momento em que um biógrafo não-desejado insiste em fazer um livro sobre a trajetória do escritor. Os factos do passado vêm então à tona e tornam claro que Joan abandonou seus próprios sonhos para viabilizar os de Jonathan, sendo mesmo ela a escrever os romances que este assinava. A ficção segue aqui muitos casos reais, de mulheres que fizeram realmente a carreira literária ou académica de homens – conheço alguns – abandonando ou secundarizando aquelas que poderiam ter seguido. Por muito que o possam parecer conviver com essa subalternidade, não creio, como acontece com Joan, que possam ser plenamente felizes.