Quando no dia 6 coloquei a cruz no boletim, votei no partido político do qual me vejo mais próximo, mas, tal como muitos milhares de eleitores, subscrevi também a «Geringonça», no que isto significa de adesão a uma solução razoável capaz de construir consensos à esquerda, de assegurar alguma estabilidade política e de manter a direita acantonada. Se tomei o gesto como a assinatura de um contrato, deverão, no entanto, ter-me escapado as letras miúdas, pois nada parecia levar a que o resultado final do processo fosse aquele agora anunciado.
Pressionados por boa parte dos aparelhos partidários – já não digo do seu eleitorado, sempre mais variável, sobretudo no segundo caso – o PCP e o PS enterraram de vez essa possibilidade, abrindo espaço a uma maior liberdade na afirmação das escolhas políticas, mas diluindo também, e em muito, a margem de expectativas negociadas capazes de a médio prazo gerar transformações substanciais, tanto na sociedade portuguesa quanto no seu relacionamento, hoje mais incontornável que nunca, com a Europa e o resto do mundo.
Não vale a pena iludirmo-nos com a ficção de que um caminho trilhado passo a passo será a mesma coisa. Não será, pois cada partido irá agora fixar-se principal ou exclusivamente na sua agenda, diluindo-se aos poucos a margem de aproximação – até cultural e comportamental – que estes quatro anos tornaram em boa parte possível. Os conflitos sociais irão ampliar-se, as divergências viscerais retomarão o caminho interrompido e viveremos um tempo de instabilidade e incerteza, episodicamente disfarçadas pela bonomia otimista do primeiro-ministro. Não, não será a mesma coisa.