É muito fácil ser-se egoísta por estes dias de medo e flagelo. Pensar apenas em nós, depois nos nossos, talvez um pouco e só bem depois nos outros. E quanto mais «outros» estes forem, menos nos importarão, mais invisíveis se tornam para nós e para as câmaras que trazem a realidade às nossas casas. Em contexto de catástrofe para a qual ninguém estava preparado, é fácil fazer exigências. Como faz quem de microfone nas mãos ocupa o seu tempo a queixar-se da incapacidade para fazer testes de despiste a quem o deseje, quando deveria saber que não existe um único Estado que o tenha podido fazer. E só um declarou até agora contar consegui-lo a curto prazo: a Islândia, que é uma ilha e tem apenas 370.000 habitantes.
Mas tão necessário e ainda mais urgente é pensar nesses «outros», nos distantes: os mais pobres, os sem-abrigo, os sem informação e que não entendem o que está a acontecer, os que vivem apinhados em bairros miseráveis, os trabalhadores despedidos ou que continuam a trabalhar para que a vida prossiga, os prisioneiros esquecidos dos familiares. Pior, muito pior: a larga maioria da população da África, da Índia ou do Paquistão, da América Latina fora dos espaços mais protegidos, onde a pandemia está a chegar e que, sem sistema de saúde, com débeis condições de higiene e um Estado eficaz, provavelmente irá morrer aos milhões. Não esquecendo os refugiados, ainda mais abandonados. Ao pé desses «outros», o nosso sofrimento será quase uma benção.
[Originalmente no Facebook]