Pela mão do meu avô paterno, aprendi a ler antes ainda da primária e com recurso a um jornal diário nacional, podendo ser esta uma das razões – gosto, pelo menos, de acreditar que assim foi – para logo me ter transformado num quase dependente da informação. Na verdade, muito poucos terão sido os dias de vida em que a partir de certa altura me mantive inteiramente longe dela, e na era pré-Internet chegava em algumas alturas a fazer largos quilómetros diários só para comprar alguns jornais. Não sei ao certo quando comecei a fazê-lo já de uma forma crítica, mas educado ainda durante o salazarismo, cedo também tive de desenvolver algumas estratégias, tanto como leitor quanto como autor, aliás rapidamente censurado. Ainda assim, habituei-me a encarar a comunicação social sobretudo como um grande espaço para o conhecimento do mundo, para a educação da sensibilidade e de mobilização para a cidadania; mesmo, como acontece de uma forma imprescindível nas democracias, quando nela se exprimem ou defendem ideias e escolhas que de modo algum são as nossas.
Por isso admito que tenho uma grande dificuldade em habitar uma realidade na qual passou a ser aceite com naturalidade, rigorosamente ao contrário do que acontecia num passado ainda não muito distante, o princípio segundo a qual «se vem no jornal, pode não ser verdade». E com as redes sociais muito desta faceta negativa piorou consideravelmente, dada a proliferação de informação não credível, a falta de respeito pela verdade sustentada ou a confusão propositada dos factos com os desejos. Nos últimos tempos tenho até notado algo ainda pior: brincar-se com o facto de a verdade poder ser mentira e, por este motivo, aceitar esta como verdade desde que satisfaça os nossos interesses, desejos ou escolhas políticas, e colaborando até nesse logro. Ao ponto de repetidamente se mentir ou se deturpar enquanto se acusam opositores, por vezes justamente, outras vezes não, de mentira ou de deturpação. É difícil, para além de perigoso, viver sem critérios de verdade que nos possam guiar com alguma segurança na selva da opinião.