O assassinato do ator Bruno Candé Marques, ocorrido pela uma da tarde deste sábado de julho numa avenida de Loures, foi, de acordo com diversos testemunhos, premeditado e de maneira inequívoca determinado por motivos de natureza racista. Deixou em qualquer pessoa digna um enorme sentimento de dor e de revolta, não só pela vida que se perdeu, para mais a de um homem ainda jovem que todos os que o conheciam apontam como talentoso, criativo e solidário, mas também pelos motivos expressos que determinaram este ato horrível.
Uma parte deles circunstanciais, como acontece nos crimes de sangue, mas a outra claramente incentivada por preconceitos ligados à cor da pele. «Preto, vai para a tua terra!», a bem conhecida frase de ódio foi repetidamente pronunciada pelo assassino. Um exemplo mais das marcas desse rancor atávico que o colonialismo e a descolonização determinaram e que, tantos anos depois, permanece ainda na consciência, herdada ou adquirida, de alguns portugueses. Atitude que a atual expansão da extrema-direita dentro da nossa sociedade multiétnica, em regra associada a uma noção distorcida de justiça histórica, tende a alimentar.
A punição de um delito desta natureza não pode, todavia, limitar-se a seguir as regras do código penal, pois ecoa algo que transcende o crime de sangue. É sinal de uma incompreensão que vai fundo numa sociedade que em regra se crê essencialmente pacífica e que é até, comprovadamente e à escala mundial, daquelas onde a taxa de criminalidade é menor. É por isso preciso algo mais que uma condenação: exige-se uma formação cívica igualitária muito mais ativa, constante e consistente, que não ignore o problema e elimine situações desta natureza, porque social e consensualmente rejeitadas desde os bancos da escola.
A ela deverá ligar-se a pesada criminalização de todas as formas de racismo, incluindo as que estão a instalar-se nos programas e na retórica dos partidos e movimentos da direita mais extrema. Aquilo de que não precisa, todavia, é dessa generalização proposta por um pequeno nicho do ativismo antirracista, que se esforça por mostrar o Portugal democrático e solidário como o país «estruturalmente racista» que em regra não é. Sabendo-se que todos os sinais de racismo devem ser firmemente combatidos. Como todos os racistas, sejam visíveis ou encapotados, andem de pistola ou cassetete na mão, ou murmurem apenas entre dentes o seu ódio.