Desde já uma declaração de intenções, destinada a que estas linhas não sejam imediatamente traduzidas num «ataque» político que não pretende ser: à exceção das eleições legislativas de 2015, em que até fui candidato de um projeto então «perdido à nascença», tenho sido, desde a sua fundação em 1999, da qual estive próximo, eleitor e regular «compagnon de route» do Bloco de Esquerda. E desta forma tenho vontade de continuar. À parte uma ou outra divergência pontual, a maior discordância formal – que na altura verbalizei de forma pública e ainda hoje mantenho -, ocorreu em 2011, quando do enorme erro politico que conduziu à dissolução do parlamento e abriu as portas, como já se esperava, aos quatro catastróficos anos do passismo. Aliás, vi-me então acompanhado por muitos militantes e eleitores «bloquistas», com quem partilhei essa fortíssima discordância. Nesse ano, o Bloco caiu dos 9,82% para os 5,17%.
Todavia, a proximidade tem sido mantida, e é ela que me faz agora discordar com a decisão, ontem tomada pelo Bloco, de votar contra o Orçamento de Estado. Não irá abster-se, como o PCP e o PAN, mas votar contra. É verdade que é quase certo a proposta do Governo passar, e que é pouco provável que este gesto conduza a eleições antecipadas em tempo de pandemia e de crise, mas a decisão terá consequências. E é incompreensível sobretudo porque, na justificação pública para que fosse tomada, não se encontram divergências de princípio, mas apenas um distanciamento em algumas reivindicações, exacerbado por artifícios de retórica. E aqui chego à segunda discordância: a insistência, por parte do Bloco, numa posição essencialmente reivindicativa e parlamentarista, e não de partido também com vocação mobilizadora e de poder. Se assim fosse, não teria ocorrido esta lamentável opção, que serve de lápide funerária à «Geringonça».