Temos um panorama razoavelmente claro da base social do populismo quando observamos as imagens que mostram a espécie de pessoas que se apresentou ontem no Capitólio para boicotar a certificação da eleição presidencial de Joe Biden. E que, por certo, se lhes tivesse sido permitido – a notória e escandalosa moderação da polícia não foi tão longe -, não teria problemas em linchar membros do Congresso e jornalistas. Olhamos aqueles rostos, a forma de vestir, de gesticular e até de caminhar daqueles indivíduos, maioritariamente homens, alguns com roupas ou acessórios militares, vemos o sentimento de impunidade e a satisfação triunfante que visivelmente exibiam, e damos de caras com o rosto da ignorância e da frustração social transportados na América por uma importante fração de deserdados «brancos».
De facto, não se viam políticos com alguma notoriedade, nem pessoas comuns com um aspeto mais ou menos estruturado e de quem percebe o alcance do que está a fazer, nem negros, entre aquela mole ululante de escória humana, mas apenas gente fanatizada, que encontra nas atitudes e nas palavras de Donald Trump a representação possível dos seus desejos mais primários, antidemocráticos, violentos e segregacionistas. Como se ele fosse um deles, a sua bandeira, a sua única hipótese de se imaginarem a partilhar um poder com o qual, de facto, não saberiam sequer o que fazer. É destas pessoas sem identidade política e, na verdade, sem ambições para além da satisfação de desejos primários, é desta escumalha humana manipulável, que o monstro do populismo se alimenta. Por isso, lá como cá, ele é tão mobilizador e tão perigoso.
Fotografia: Roberto Schmidt/AFPPublicado originalmente no Facebook