Desde o historicamente trágico desastre ocorrido em março de 2011 na Assembleia da República, com a entrega de mão beijada, com as consequências que sabemos e depressa pudemos sentir, do poder à dupla Passos e Portas, e ao longo de toda a última década, tenho procurado que a minha leitura opinativa da atividade da esquerda parlamentar portuguesa de modo algum belisque a possibilidade de, na diferença, esta se entender naquilo que é realmente importante para a maioria das pessoas. Ou seja, a democracia, o bem-estar, o desenvolvimento, a solidariedade social, a cultura e os direitos humanos. Tendo esse entendimento sempre como condição imperativa o afastamento da área da governação da dinossáurica direita lusa, adepta cega e contumaz do neoliberalismo e inimiga jurada de um Estado social regulador e protetor.
Nestes anos, foram inúmeras as vezes que me inibi de referir em detalhe o que penso sobre algumas más escolhas dos partidos da esquerda. Fi-lo sempre que esse gesto de algum modo pudesse pôr em causa, no território de opinião onde intervenho e encontro quem me leia, a possibilidade de uma aproximação estratégica razoável na defesa do que é essencial. Todavia, os recentes acontecimentos parlamentares, que bloquearam, sem volte-face à vista, uma margem de cooperação e de respeito entre as esquerdas, libertaram-me do contrato de contenção que assinara comigo mesmo e com essa tão necessária aproximação. Para, agora com grande leveza e liberdade, tentar ajudar a alimentar caminhos e soluções que requerem reflexão crítica, diálogo e compromisso, não carradas de cegueira, acrimónia e sectarismo.