1. Como qualquer pessoa razoavelmente atenta e avisada previa com bastante segurança, a guerra, sob a forma de invasão, prevista por uas quantas almas para começar esta semana entre a Rússia e a Ucrânia, de facto não teve lugar. E, mesmo considerando, para quem tenha fé, que o futuro só a Deus pertence, muito dificilmente ocorrerá nos tempos mais próximos. Tratou-se de um jogo de pressões e chantagens que, obviamente continuará, na qual cada uma das partes procura assegurar posições num processo de equilíbrio instável. Pelo menos enquanto prosseguirem as disputas territoriais e os conflitos de influência entre Moscovo e Washington, com a União Europeia de permeio. Misturar o desejo de alimentar o sensacionalismo com o visionamento dos filmes de ação não é grande munição para produzir análises criteriosas de política internacional.
2. Destaco um tópico que, no meio do que se tem escrito sobre a situação na região, quase não tem sido mencionado. É verdade que existem áreas da Ucrânia nas quais a maioria da população, ou pelo menos uma percentagem muito significativa, é de origem russa. Mas não é possível esquecer que a maior parte dela descende daquela deslocada para o país no tempo de Estaline para repovoar a região após a Grande Fome (Holodomor) de 1932-1933, provocada pelo brutal Primeiro Plano Quinquenal, que fez colapsar a produção agrícola matando milhões de ucranianos, e depois, logo após o final da Segunda Guerra Mundial, para fazer face ao morticínio determinado pela ocupação alemã e pela própria guerra, bem como à deportação em massa de ucranianos acusados, alguns com razão, mas a maioria sem ela, de compactuarem com o invasor. É verdade que isto já aconteceu há muito tempo, mas quando se invoca a história para justificar determinadas posições não pode ser apenas parte dela.
A fotografia acima é dos campos da Ucrânia – existe um número apreciável delas – durante o Holodomor.