O uso de lugares públicos para proveito próprio é transversal a diferentes regimes. Não pode ser utilizado, como o fazem principalmente os fascistas e os populistas, para caraterizar a democracia e os partidos como fontes de natural corrupção, mas emerge, seja em que regime for, de todas as vezes que o sistema político não desenvolveu regras e práticas rigorosas que a contenham. Por muito que alguns casos venham a lume, ficará para sempre por fazer, por exemplo, um inventário completo da forma como entre nós o poder autárquico – onde tanto de positivo tem sido feito, onde tanta dedicação à coisa pública existe, sem dúvida alguma – em muitas situações alimentou ou encobriu interesses pessoais que todos os cidadãos constatam, mas poucos estão em condições de provar. Cargos ainda mais elevados podem, naturalmente, suscitar situações mais escandalosas.
O caso do ex-ministro da Economia Manuel Pinho é um triste sinal desta situação. Para além das conhecidas ligações ao Grupo Espírito Santo, já de si elemento curricular pouco abonatório, Pinho vem agora confirmar que usou «habilidades» para esconder património quando se tornou governante. E declara que não se tinha apercebido das transferências mensais de 15.000 euros indevidamente recebidas de uma sociedade ‘offshore’. A falta de vergonha que argumentos destes traduzem comprova que todo o detentor de altos cargos públicos deve ser forçado a rigoroso escrutínio de bens e rendimentos. Partindo de um princípio que deveria ser regra sagrada: em democracia, esses cargos são serviço prestado à comunidade, pelo que não podem constituir via para o enriquecimento. Há quem diga que isto «afastaria os melhores», mas «melhores» destes são dispensáveis.