1. Três perguntas (retóricas) algo incómodas ligadas entre si. As honestas e piedosas pessoas que, como forma de resolução do problema ucraniano, propõem a realização de uma conferência de paz – até aqui com o meu acordo, que assino por baixo sem hesitar -, mas para a qual o agressor russo não parta pressionado nos planos político, económico e militar, acreditam mesmo que perante essa possibilidade Putin vá recuar nos seus objetivos imperiais e nas suas ameaças? E que mude de posição de livre e expontânea vontade, após um súbito rebate da consciência? E que todo o rastro de morte e destruição envolvendo os ucranianos, e também muitos russos, se resolverá com uma varridela dos escombros, uma palmada nas costas e um «o que lá vai, lá vai»?
2. Não existe guerra sem mortes de ambos os lados. Quem vem agora invocar eventuais atrocidades ucranianas não pode deixar implícito que o país se deveria defender da agressão russa com flores e baladas à paz. Tem todo o direito a defender-se pelas armas e a invocar auxílio. Aliás, se o não tivesse feito por certo Putin teria entrado em Kiev nos tais três dias que os generais russos (e os nossos majores-generais aprendizes) previam para ver a conquista consumada. Deixo um dado exemplar: o país com maior número de civis mortos durante a Segunda Guerra Mundial foi a União Soviética, estima-se que com cerca de 26,6 milhões, mas o segundo foi a Alemanha, com cerca de 8 milhões, tendo estas mortes sido esmagadoramente provocadas pelos Aliados durante o assalto final ao Reich. A guerra, mesmo quando justa, é sempre terrível e assassina. Sempre.
3. Quem está atento já percebeu que sobre esta guerra a posição do PCP mudou um pouco para ficar na mesma. Após numa fase inicial ter mostrado a maior compreensão para com a iniciativa de Putin, esse suposto herói da luta anti-imperialista – como já o fizera, ainda há poucos anos, quando da destruição das cidades sírias que resistiam a Assad –, passou, perante a pressão da opinião pública, a defender as pombinhas da «paz». Uma «paz» do interesse de Moscovo, obviamente, e que traduza em primeiro lugar um recuo da União Europeia e da NATO. Para o defender até foi buscar ao armário dos adereços esse produto da Guerra Fria na sua fase final, o Conselho Português para a Paz e Cooperação, ativado de cada vez que na arena internacional importa atacar o inimigo principal e defender um determinado ‘status quo’.