Entre os anos 60 e 80 a publicidade portuguesa, pelo menos aquela que aparecia na televisão, na rádio e nos jornais e revistas de maior circulação, possuía em regra elevada qualidade, tanto no domínio do texto, sempre imaginativo e literariamente cuidado, quanto no plano gráfico e no da realização. Recebia regularmente prémios internacionais e era até, em boa parte, um espaço usado para passar mensagens subliminares contra a paisagem de «vil tristeza» cultural ou no campo dos hábitos que era imposta pelo regime. Alexandre O’Neill e Ary dos Santos, como antes deles Fernando Pessoa, por exemplo, trabalharam na área, transformando o seu esforço nesse domínio em pequenas peças literárias. Assis Pacheco também criou alguns slogãs. Muitas pessoas com memória da época recordam como a publicidade se misturava com o quotidiano, surgindo até, algumas vezes, como momento poético ou inspiração para paródias.
Bem longe vão esses tempos, sem dúvida, e atualmente é absolutamente insuportável prestrar atenção ou sequer aceitar a maioria da publicidade, em particular aquela que surge na rádio e na televisão. Agressivamente gritada e quase sempre estridente, acompanhada de música ou de ruído a condizer, com corruptelas de português propositadas, dita muitas vezes com uma pronúncia de «jovem irreverente» ou de «menina tola», cheia de clichés, alguns subalternizando ou ridicularizando as mulheres e as pessoas mais velhas, parece feita como negativo do país que somos, globalmente mais educado e igualitário no curso do processo vivido nestes quase cinquenta anos de democracia. Por mim, deixei mesmo de seguir canais e algumas estações da rádio ao sentir-me constantemente agredido por tal lixo, aparentemente concebido para quem não se importa muito por levar com ele em cima.