Jamais a alguém, vivo ou morto, incluindo a mim próprio, aparentemente vivo, considero «acima de toda a suspeita». Impressiona-me o elogio de pessoas públicas, quando estas desaparecem, feito como se elas fossem perfeitas, sem a mínima ruga ou pecado. Quando, na realidade, não existe ninguém – eu não conheço, nem mesmo ao meu mestre Camus, que ponho acima de Cristo – sem defeitos, alguns até dificilmente desculpáveis. Basta conhecê-las um pouco melhor, e eu tenho conhecido algumas, não apenas dos livros ou da televisão, cuja partida nem por isso deixei de sentir com alguma ou muita dor.
É claro que no momento da despedida, muitas vezes inesperada, ou quando ainda se aguardava tanto daquela pessoa, compreendo o rasgado elogio, entendo que se destaque aquilo que de bom acrescentaram e deram aos outros, percebo que se mostre como eram singulares. Eu também o faço de vez em quando. Mas, tal como não há vivos perfeitos – acredito que uma vida sem pecado não vale nada -, também não há mortos acima de toda a suspeita. Perdoem se isto, que não se refere a alguém em particular, mas a uma tendência mil vezes repetida, não resulta assim muito bonito.
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