Como já aqui escrevi, aprendi a ler, antes ainda da primária, com a ajuda do avô paterno e através dos jornais, sobretudo do Diário de Notícias. Terá sido em 1957, pois no ano seguinte já decifrava a propaganda da campanha de Humberto Delgado. Viciei-me logo em informação e cedo passei a ler sem falha vários títulos diários ou semanários, tendo esse número crescido ao longo do tempo. Só o reduzi quando do governo da troika, pois não conseguia pagar tantos jornais e alguns tornaram-se porta-vozes do governo, deixando de me interessar. Ao mesmo tempo, estreei-me a escrever na imprensa aos 17 e não mais parei, tendo ainda, ao longo da vida, sido amigo de muitos profissionais da informação. Além disso, dei aulas num curso de jornalismo por uma década, tendo sido professor de centenas de profissionais. Isto atestará que não sou contra os jornais ou «contra os jornalistas», como certa vez li aplicado à minha pessoa.
Tudo isto para dizer que foi sensivelmente há sete ou oito anos que transferi de vez a minha leitura quotidiana dos jornais e revistas inteiramente para os suportes do digital, acompanhando as páginas eletrónicas de diversos títulos nacionais e internacionais, algumas delas por assinatura, ou lendo os seus e-papers em formato pdf. Hoje, jornais em papel só consulto mesmo em arquivos públicos e privados, sempre que estes não se encontram ainda digitalizados. É claro que continua a dar-me prazer e proveito a leitura no papel, e partilho aquele cliché geracional sobre o toque e o cheiro, mas as vantagens em relação aos jornais – sobre os livros talvez escreva noutro dia – é realmente imensa.
Vejamos. Posso acompanhar as notícias quase sobre os acontecimentos e em atualização, posso guardá-las e arquivá-las, posso ler artigos e crónicas que apenas são publicados na edição em linha, posso acompanhar títulos que apenas são editados no digital, posso partilhar a informação que me passa pelos olhos e pelos dedos e me parece interessar a outras pessoas, e posso ainda manter bem menos atulhados e mais higiénicos os lugares onde moro ou trabalho. Aliás, a tendência parece hoje alastrar-se, mesmo por cá: como exemplo, o diário Público tem, em números redondos, uma tiragem de 102.000 exemplares diários no total e o número de assinantes do digital ronda os 48.000, perto de 50%. É claro que respeito ao máximo quem mantém o hábito e o gosto de ler só edições em papel, proclamando que jamais abdicará delas, mas talvez fosse bom essas pessoas tomarem consciência daquilo, muito, que estão a perder.
Rui Bebiano