Nunca me ponho a correr diante de uma polémica. Desde que, para além de para ela me achar virado, a mesma se estabeleça entre pessoas que, pensando de diferente forma, respeitam a opinião do contraditor. Por isso, não sou capaz de polemizar, a propósito do «caso Günter Grass», com Luís Mourão ou com Carlos Leone. Porque, não agredindo qualquer um deles a minha leitura a propósito do passado de SS de Grass, também não discordo substancialmente dos argumentos que um e o outro invocam. Ambos aceitarão que não seja novidade alguma para mim a perspectiva segundo a qual «toda a leitura que valha a pena será sobretudo uma relação impessoal com uma voz que passa através daquilo a que chamamos autor» (LM), ou, em diferente direcção, que eu aceite que se não deva «chamar consciência moral a quem nunca fez mais do que generalizações vazias e grotescas sobre história» e, ademais, «sempre foi ridículo, como o é agora» (CL). Partindo de pressupostos de certa maneira opostos, e provindo de pessoas que sei lerem por hábito de uma forma acentuadamente crítica, as duas afirmações não podem deixar de ser respeitáveis (bem, a segunda frase de CL sê-lo-á de forma menos peremptória…). Só que existe um padrão de leitor, chamemos-lhe o leitor cândido – como eu o fui quando tinha quinze anos e pela vez primeira li GG, ou como o gosto de ser ainda quando me entretenho a folhear Groucho Marx, Maria Filomena Mónica ou os títulos d’A Bola -, para o qual um dado autor «é» aquilo que lhe indiciam ser, estabelecendo com ele um pacto de confiança que essa candura determina. Foi entre esta imensa turbamulta que, sem complexos, e em nome da tal relação que estabelecera com uma «consciência alemã anti-nazi do pós-guerra», me incluí quando escrevi o post-em-choque que ambos de alguma forma questionaram. Desconfio que, para uma boa parte dessa multidão, a revelação em causa possa funcionar como o tal golpe publicitário que as leve a correrem para as portas das livrarias como se um novo e cada vez mais graúdo Harry Potter estivesse para chegar. Mas admito que os mais influenciados por uma informação intensamente mediatizada o façam (e de um registo na Wikipedia já ninguém os livra). Sorte, neste caso, a das contas bancárias de GG e dos seus editores.
A culpa (2)
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