Sei onde poisei a minha última máquina de escrever da última vez que me servi dela, há mais de vinte anos. Mas não tenho vontade alguma de a ir buscar para lhe tirar as incrustações de pó. O «fetiche da Underwood» – que no meu caso era uma modestíssima Triumph com um design que a aparentava com um igualmente modesto automóvel Trabanta – quase me ia dando cabo das costas. Passou-me com o tempo, como a extravagância de fumar cachimbo, que, essa, me estragou definitivamente os dentes. Algumas revistas literárias e ex-libris digitais continuam porém a usá-la, talvez como metáfora de uma qualquer relação matricial com a escrita, ou enquanto pulsão nostálgica, idêntica aquela que nos pode levar, perdoem a imagem de jogos florais, a mergulhar sem necessidade numa manhã de chuva e nevoeiro. Talvez por isso, soa-me um tanto a mania que um homem maduro, moderno e morador em Brooklyn, como Paul Auster, faça sistematicamente questão de exibir em público a sua aversão a qualquer outro instrumento mecânico de escrita. E se empenhe em lançar, em conjunto com o artista plástico Sam Messer, o narcísico álbum A História da Minha Máquina de Escrever, que a ASA editou. Não é que não seja bonita a sua Schreibmaschine Olympia, mas mostrá-la assim parece sinal de caturrice precoce.
A máquina
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