No Dictionnaire des Lieux Imaginaires, Alberto Manguel recorre a uma fábula de Edgar Allan Poe publicada em 1838 para descrever a terra do Silêncio terrível e atraente, naturalmente ficcionada mas nem por isso menos temível. Muito longe ainda dos devaneios ecologistas que no Ocidente despontarão bastante mais tarde, exprime-se aqui, em plena era da afirmação do capitalismo industrial, a sensação do carácter aflitivo, constrangedor, de uma natureza estagnada. A felicidade que muitos concebiam ancorava então no triunfo da máquina, no convívio com o fumo negro das enormes chaminés, no contacto diário com o ruído e a limalha de ferro. Apesar do empolgamento de alguns românticos com a nostalgia da natureza, nada parecia mais estranho, medonho, demoníaco, do que um mundo completamente mudo e paralisado.
SILÊNCIO. Região da Líbia, delimitada pelo rio Zaire, cujas águas, amarelentas e insalubres, jamais atingem o mar, palpitando eternamente sob o Sol, numa efervescência convulsiva. Ao longo de quilómetros o leito do rio encontra-se juncado de gigantescos nenúfares. A região sufoca debaixo de uma floresta maléfica e sombria, com flores envenenadas e uma vegetação rasteira perpetuamente agitada, apesar da ausência de vento. Na margem do rio existe um grande rochedo cinzento no qual um conjunto de caracteres gravados forma a palavra Desolação. Todo o país vive debaixo da maldição do silêncio. A lua permanece imóvel e relâmpago algum perturba o céu, no qual as nuvens permanecem sem trânsito algum. Experimenta-se ali a angustiante sensação de vivermos atacados pela surdez e reduzidos a um total mutismo.