Tenho um problema com os quartos de hotel. Aliás, creio que muitas pessoas que conheço têm o mesmo problema com os quartos de hotel. Quase todos eles contêm um aparelho de televisão, toalhões confortáveis e armários generosos. Muitos possuem cortinas automáticas, ar condicionado e, por vezes, um minibar com desenxabidas garrafinhas de ginger ale e de vermute. As camas são impessoais mas agradam-me quase sempre pela sensação de teleportação que oferecem. O problema apenas se revela quando queremos ler e escrever: para além de luzes insuficientes e mal orientadas, geralmente não têm secretárias ou mesas que permitam uma relação decorosa entre o corpo e o computador, ou entre os nossos olhos e as páginas de um livro. Alguns ainda possuem, numa daquelas peças longilíneas de mobiliário de madeira escura que se encostam a uma parede, papel e envelopes timbrados para escrevermos cartas, e até, como me aconteceu há dias numa cidade do norte, folhas de papel mata-borrão. Embora hoje já ninguém escreva em quartos de hotel cartas em papel timbrado – excluindo talvez alguns suicidas – e, à excepção de certos dirigentes do CDS, ninguém se sirva já em viagem de canetas de tinta permanente. Agora mesas e candeeiros decentes, para ler e escrever, disso quase não se vê. É quando estou dentro de um desses quartos, como acontece neste preciso momento, que me apercebo do quanto anda a intervenção da ASAE desviada daquelas que deveriam ser as verdadeiras prioridades.