Mesmo em tempo de Internet, as revistas especializadas de grande circulação publicadas em papel dão-nos imenso jeito como fontes de informação actualizada, veículos de opinião ou pontos de partida para aceder a determinados temas. As que circulam entre nós são quase exclusivamente estrangeiras, com um claro destaque, em campos como a história, a literatura, a filosofia ou as ciências sociais, para aquelas que se publicam em França. O que apenas será estranho se não considerarmos que a maioria dos seus compradores pertence a um segmento social e etário cuja formação conservou ainda o francês como segunda língua. São pois em francês os três números temáticos de revistas que aqui destaco e podem ser encontradas em alguns quiosques e livrarias.
A Philosophie Magazine é sobre um tema – XXe siècle. Les philosophes face à l’actualité – particularmente útil numa época de desvalorização do papel interventivo do intelectual e da sua revisão como conceito operativo. Comporta largas dezenas de fragmentos de intervenções públicas de importantes filósofos, colocando-os em confronto com as suas circunstâncias. De Bergson, Berdiaev, Kraus ou Benjamin até Baudrillard, Zizek, Enzensberger e Amartya Sen, sucedem-se intervenções participativas sobre temas como a guerra, a revolução bolchevique, a ascensão dos fascismos, o Holocausto, a questão colonial, os feminismos, os acontecimentos de 1968, a conquista do espaço, a queda do Muro, o neoliberalismo, o «choque de civilizações», a globalização ou o conflito real-virtual.
Já o Magazine Littéraire publica um número especial que tem como assunto La Passion – théâtre de l’existence. Aqui o objectivo é coligir cerca de três dezenas de artigos publicados na revista, ao longo de mais de vinte anos, tendo sempre em conta uma dupla abordagem da paixão, seja esta afirmada por um ser amado, por uma causa, por uma actividade ou por uma ideia. A primeira abordagem é talvez a mais antiga, e é associada a um certo desregulamento da personalidade, a uma forma de exaltação ou de doença. A outra, mais recente, aproxima-a do desejo, da vertigem, da exaltação. Flutuando sempre entre a melancolia e a acção.
Para fechar, o bimensário Manière de Voir, editado pelo Le Monde Diplomatique, preocupa-se na edição de Agosto-Setembro com De Lénine à Poutine: Un siècle russe. Esta será, sem dúvida, a mais controversa das três publicações. Por ser a única que oferece textos centrados num tema cujas ondas de choque permanecem, tanto ao nível das representações de um passado recente como no que diz respeito aos contornos do mundo contemporâneo, plenamente activas. Estes distribuem-se por três partes organizadas cronologicamente: a primeira vai da Revolução de Outubro à resistência perante os nazis, a segunda parte da Guerra Fria e fecha com o aparecimento da perestroika, e a última ocupa-se do tempo preenchido com as presidências de Yeltsin e de Putin. É na primeira parte, centrada nos fundamentos do regime soviético e na perversão do Gulag, que se torna possível detectar os textos mais polémicos. Mas os mais perturbantes são aqueles que revelam a Rússia actual como um território que se mantém perigosamente inflamável.