A Festa do Avante!, organizada pelo PCP a cada setembro, nasceu em 1976, já na fase de refluxo do processo revolucionário, como uma forma de agregação da militância comunista e também como espaço de resistência política e cultural. Inspirou-se em boa parte na do jornal L’Humanité, criada em 1930, com a qual o PCF visou objetivos de certa forma análogos. Teve desde o início uma componente lúdica – aquela que ocupou sempre mais tempo do programa e que atraiu pessoas de diferentes quadrantes sociais e políticos – e outra assumidamente política, traduzida em algumas escolhas artísticas, em uma ou outra sessão cultural, nas brochuras e bibelôs dos pavilhões dos «partidos irmãos» e sobretudo no grande comício final de domingo à tarde.
Passou por fases distintas, mas sempre como espaço popular e de grande abertura – fui a quatro delas, no início, quando com mais dinheiro disponível para pagar aos artistas o programa musical era quase sempre cinco estrelas – e também como lugar onde todos os anos milhares de comunistas, muitos com a oferta de trabalho voluntário retirado ao seu descanso e às suas férias, vão recarregar as baterias da militância e da convicção rodeados dos seus símbolos e influências. Todavia, a dimensão política é-lhe mais atribuída por esta vivência do que pelo programa, idêntico na forma a muitos outros festivais de verão, embora a sociologia destes seja diversa. A Festa é em larga medida a romaria, o farnel, o convívio, o namoro, a música, as exposições, e só depois outra coisa.
Pouco ou nada a ver, por isso, com eventos políticos simbólicos e com data marcada como os ocorridos no 25 de Abril e no 1º de Maio, onde foi possível organizar as coreografias de um modo de certa forma rígido, associado aos condicionalismos do momento. É, por este motivo, de todo complicada e difícil a sua realização neste ano de pandemia, tal como o foi a forma bastante condescendente como o governo se lhe tem referido. Salvo se o PCP puder assegurar que aquilo que irá acontecer será outra coisa, colocando este ano entre parêntesis o habitual slogã «Não Há Festa Como Esta!» Seja como for, é necessária neste campo a maior prudência, não se aceitando situações que depois possam revelar-se desastrosas. E o PCP, que é seguramente um partido prudente, irá por certo agir em conformidade.
Rui Bebiano
Fotografia: Paulo Pimenta / Público