Uma vez mais, as eleições no país que nos coube na sorte da história e da geografia ter aqui mesmo ao lado parecem pouco ter a ver connosco. A atenção da comunicação social portuguesa é reduzida, e a ocorrência do tema na opinião pública – se procurarmos ver, por exemplo, a sua presença nas redes sociais ou em debates na televisão e na rádio – é residual. E, no entanto, algo teríamos a ganhar se usássemos alguma da sua experiência como possível exemplo, ou como ponto de partida para olhar num plano comparativo a nossa própria vida comum. Assim aconteceria se, por exemplo, tivéssemos reparado no comportamento dos partidos que participaram na noite de ontem, quarta-feira, no último debate entre os principais candidatos a primeiro-ministro organizado pela RTVE.
Eis alguns factos rápidos que poderiam servir de termo de comparação. Desde logo a ausência de Alberto Núñez Feijóo, do PP, que como o seu equivalente deste lado da fronteira – sim, que o partido homólogo, de direita, é o PSD, de social-democrata apenas tendo o nome herdado – não assume com clareza a possibilidade de, para ser governo, se tornar aliado da extrema-direita, fugindo ao tema sempre que este se coloca. De notar também a atitude do Vox, de extrema-direita, ideologicamente mais estruturado e também mais radical que o «nosso» Chega, mas com maior capacidade discursiva e de produzir propostas. Assim, o seu chefe, Santiago Abascal, não falou como o arruaceiro Ventura, procurando antes apresentar uma atitude de «homem de Estado».
Do lado da esquerda, a apresentação de Pedro Sanchez, do PSOE, foi a esperada. Manteve a esperada posição de «moderado de esquerda» e, sem se comprometer em demasia com dinâmicas de «tudo ou nada», como o nosso PS, acabou por deixar a iniciativa a Yolanda Diáz, do Sumar (que inclui a Unidas Podemos), claramente dominadora do debate e capaz de nele impor a sua agenda. Vale a penas olhar a atitude desta, bem como a agenda da coligação da «esquerda à esquerda» que nesta altura lidera. Desde logo assumindo a atitude de quem quer governar, e não manter apenas uma atitude de protesto, como acontece com as forças que entre nós consideramos suas próximas. Mas, ao mesmo tempo, tomando o enfrentamento da extrema-direita como principal e mais urgente bandeira.
Iremos ver o que acontecerá no domingo, 23 de julho, mas nada ganharemos, sejam quais forem os resultado das eleições, em fazer de conta que pouco ou nada terá a ver connosco. Afinal, de Espanha, há sempre um vento que sopra.
Rui Bebiano