Vi Easy Rider seis vezes. E todas elas em poucos meses, três numa única semana. Tinha 17 anos, pouco cinema à disposição, detestava a vida imutável da cidade pequena e imaginava-me um pouco a percorrer as estradas americanas que me pareciam infinitas. Era aquela, para mim, a América. Desmedida e contraditória, feita de rapazes como aqueles, bons armados em maus, que se passeavam, soberbos, por entre simplórios da Louisiana com cara de sacanas. Mais conflito de gerações que luta de classes, sem dúvida. As stars and stripes pintadas na Harley Davidson de Wyatt (Peter Fonda), o chapéu de batedor fora do tempo usado por Billy (Dennis Hopper, também o realizador do filme), pareciam-me trocistas, provocadores. American dream às avessas com marijuana à descrição. Mas só depois do deprimente final – a morte violenta dos dois argonautas: «It’s Alright, Ma (I’m Only Bleeding)» – percebia definitivamente o olhar cínico de Fonda. Para o exorcizar, voltava então a ver tudo de novo.