Storia della Bruttezza, o último livro de Umberto Eco, deveria chamar-se em português História da Fealdade, e não História do Feio, como aconteceu na novíssima edição da Difel. Pois aquilo que se expõe neste esplêndido livro-álbum (precedido de uma História da Beleza publicada em 2004) não é o relato da sucessão de debates em redor do conceito, mas antes uma avaliação, formal e situada no tempo, «do feio em si mesmo (um excremento, um cadáver em decomposição, um ser coberto de chagas que emana um cheiro nauseabundo)» e também «do feio formal, como desequilíbrio na reacção orgânica entre as partes e o todo». A ambos associa ainda Eco um terceiro tipo, resultante da representação artística dos dois primeiros.
É então em redor das figurações da fealdade que concretizam o conceito flutuante de feio, que este livro é construído. Que ele nos vai mostrando um cortejo de diabos, monstros e portentos, de figuras grotescas e carnavalescas, mulheres pavorosas, bruxas e seres sádicos. E também de românticos que se comprazem da sua fealdade (infelizes, doentes, perseguidos, solitários), de decadentes, freaks, fantasmas e mortos-vivos, de produtos resultantes da recusa vanguardista do consenso, das expressões desequilibradas do kitsch e da estética camp. Integrando reproduções de imagens e de textos que, longe de qualquer paradoxo, produzem no leitor uma sensação ambígua, amálgama de repulsa e de atracção, de horror e de beleza. Recorrendo a uma estratégia de compulsão que o triunfo da imagem e as estratégias contemporâneas da comunicação conduziram hoje a um ponto de neutralidade. A este lugar onde os conceitos de belo e de feio perderam o seu lado aparentemente absoluto e deixaram de funcionar como opostos. Podemos, a partir das páginas deste livro, perceber melhor o modo como aqui chegámos.