Começa enfim a sair dos baús a memória de uma singular «África portuguesa», vivida apenas por algumas comunidades de brancos e de «assimilados». Há cerca de doze anos atrás, quando comecei um projecto destinado a inventariar uma parte desse legado, – projecto depois gorado, por ter surgido fora de tempo e enfrentar obstáculos na altura ainda intransponíveis –, toda aquela vivência permanecia fechada sobre si mesma, inacessível, geralmente envolvida em traumas, medos e rancores. A transposição para os territórios coloniais de determinadas marcas da cultura de regime instalada na «Metrópole» – como o folclore em versão «estado-novista», o fado de salão, a canção ligeira oferecida pelos «melhores artistas da rádio e da TV», os concursos de misses, as corridas de automóveis, os torneios de ténis, o futebol com as camisolas locais do Benfica ou do Sporting – parece-nos hoje, quando espreitamos alguns dos seus ecos na série televisiva de Joaquim Furtado, algo de estranho, de improvável, que jamais terá existido. Mas a verdade é que existiu e o seu rastro não pode, nem deve, ser apagado. Um bom exemplo desse aparente «Portugal de cartolina» é-nos recordado por Joana Lopes num post-documento sobre as Marchas Populares de Lourenço Marques. O «lusotropicalismo prático» em todo o seu esplendor.
A imagem é retirada do blogue de Joana Lopes.