No prefácio a uma edição recente de Renaissance Self-Fashioning, o historiador da cultura (e não só) Stephen Greenblatt conta um episódio curioso ocorrido em Berkeley no ano de 1975. Michel Foucault, que acabava então de publicar o seu Surveiller et Punir, encontrava-se naquela universidade para leccionar um seminário semestral organizado pelo Departamento de Francês e divulgado aos potenciais interessados como sendo sobre a obra de Émile Zola. Greenblatt tinha pouco interesse por Zola, mas muita vontade de ouvir Foucault, e por isso inscreveu-se no referido seminário. No entanto, ao longo de todo o semestre, o filósofo não mencionou uma única vez o seu compatriota romancista. As sessões foram todas sobre o conceito de penitência na história da Igreja católica medieval, o que não parece ter caído mal em qualquer um dos inscritos. Na Europa à bolonhesa que nos cabe agora na rifa, com tudo previsto e aprovado para valer «créditos» destinados a oficializar «competências», esta sorte de golpe-de-rins já quase parece impossível.