O historiador mudo
Desde que alguém passou a ocupar parte da vida a reunir e a dar um sentido a fragmentos do passado, expondo-os aos olhos dos outros, existe uma reflexão sobre a função e a condição de quem a essa tarefa se dedica. Numa entrevista publicada em 1997 na Sciences Humaines, Jacques LeGoff falava de três grandes obrigações, que de algum modo interferem nas circunstâncias com as quais o historiador convive: investigar, ensinar e divulgar. O modo de o fazer, ou de o não fazer, é que define os diferentes pontos de vista. Seria fastidioso, e seguramente pouco motivador para a leitura casual e instantânea que se faz no espaço de um blogue, a exposição e o debate das diferentes conceções, tendências ou atitudes que sobre esse papel complexo têm sido produzidas e divulgadas. Mas vale a pena olhar para um lado do assunto que se presta a frequentes equívocos. Principalmente numa época como esta que cruzamos, na qual, apesar do recuo da História como saber nos programas escolares, nas preocupações dos governantes e na consideração pública, a palavra dos historiadores continua a ser utilizada, ou cirurgicamente manipulada, como instrumento de legitimação do discurso político, tanto do lado dos que procuram conservar o poder como da parte dos que o tentam conquistar. (mais…)